Nesta quinta-feira, a partir das 19 horas, o escritor pernambucano Fernando Monteiro lança “Vi uma foto de Anna Akhmátova” na Siciliano do Midway. O escritor retorna à poesia depois de vários romances consagrados e premiados como “Aspades, Ets, Ets” e “A Cabeça no Fundo do Entulho”.
Na entrevista abaixo, enviada por Tácito Costa, Monteiro fala um pouco sobre essa sua nova obra:
1- Por que o retorno à poesia?
Porque a prosa não está nada bem, em may opinion (como diria o novo acadêmico Fernando Affonso Collor de Melo). Imodestamente, esclarecer: não a minha [prosa], até que ela vai bem, obrigado, porém a dos outros está montando a merda, isto é, a prosa-fácil no cenário de escritores “multimídia” (que porra vem a ser isso?) aparecendo como piolhos de Bienal, entrevistados da TV e convidados de Flips, Flops e Flups. Literatura, atualmente, é Mercado, no mundo inteiro – e o Brasil vai atrás, o Unibanco por trás da Flip, as Companhias das Letras [e outras] se possível transformando tudo em sopa de letrinhas para neófitos de Parati. Se isso é para ti, isso não é para mim. Fui. Voltei para a Poesia – que pelo menos foi deixada em paz pelos editores (porque não dá dinheiro mesmo etc). Viva isso: não dar dinheiro! Tudo que “não der dinheiro”, neste momento, é melhor do que tudo que dá dinheiro, como diria o velho Sherlock Holmes, como sempre acrescentando: “elementar, meu caro Watson”.
2 – Como explica a opção pelo poema longo?
O poema a que voltei é não só longo, como narrativo (muitíssimo pouco exercitado, cá em Pindorama). Porém, acredito em Dámaso Alonzo: o grande espanhol dizia que um modo de recuperar, talvez, o leitor de poesia afastado pela lírica dos pequeninos “estados d’alma”, seria retornando, ou tentando retornar, para o poema longo que foi o praticado nos inícios: a Ilíada, a Divina Comédia, o Paraíso Perdido, Jerusalém Libertada etc. Quem sabe o viciado leitor de romances não seria “pescado” pelo fio narrativo do que Alonzo chamava de antigo contenido novelesco da grande poesia?
3 – Qual sua relação com a poesia e a história de Anna Akhamátova?
Anna Akhmátova é um ponto de partida, quase um “mote” do poema – que reflete, no todo, sobre o século que passou (no qual Anna foi uma das vozes mais puras – e mais torturadas – da literatura que tenta meditar sobre o mundo).
4 – Que aproximações vê entre o universo em que a poeta russa viveu e o atual brasileiro?
O mundo que Anna conheceu foi, em grande parte, o que ainda vige (Virge!), vigora, permanece, continua doido e sem rumo. Há uma crise civilizacional por sobre as demais crises – e as pessoas só enxergam a crise do aumento da passagem de ônibus (respeito essa mini-micro-crise, porém eu gosto de andar a pé pelas ruas de aragens súbitas do Recife)…
5 – Pessimismo e tristeza perpassam “Eu vi uma foto de Anna”… De onde vem isso?
Vi uma foto de Anna Akhmátova não poderia ser, jamais, um poema “alegre” (deixo a alegria toda para Carpinejar, por exemplo), num mundo capaz de assassinar quase duzentas crianças naquela escola de Beslan, na Ossétia do Norte, há cinco anos. Isso não dá margem para gargalhar como um louco, por sobre as desgraças provocadas pela grande crise: a do Humanismo, no bloco da civilização exausta que herdamos.
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