Por Julio Daio Borges
no Digestivo Cultural
A música piorou muito. Correção: a música, que circula no mainstream, piorou muito. Com a ascensão do CD, e de estilos como “lambada”, “sertanejo”, “axé” e “pagode”, nos anos 90, a indústria fonográfica vendeu como nunca e nivelou por baixo, como nunca também, a programação das rádios e as atrações musicais da televisão. Nos anos 2000, com a ascensão da internet e a falência do CD, as majors arranjaram a desculpa, que estavam há muito procurando, para não mais investir em qualidade, bajulando a ascendente classe C (da era Lula) e despachando os “medalhões” para os pequenos selos (relegando, ainda, os jovens talentos à obscuridade do Long Tail)...
A saída, para quem quer evitar armações musicais da década de 2010, é não circular por ambientes públicos com música (mesmo praias), evitar, a todo custo, a frequência das principais FMs, fugir como o diabo da TV aberta e abandonar, inclusive, as seções culturais de revistas e jornais – que ou divulgam “todo mundo”, sem nenhum critério (“procura-se críticos musicais”), ou dão o milionésimo destaque a Roberto Carlos e... Ivete Sangalo.
Dado o presente estado de coisas, como introduzir uma criança na música de qualidade, se as velhas referências estão em ruínas e as novas não tiveram tempo ($) ainda para se consolidar? Para quem não quer se limitar aos Baby Einsteins da vida – que até fazem releituras interessantes, em marimba, de monstros como Bach, Mozart e Beethoven – existe, no Brasil, a coleção MPBaby, da MCD.
Tudo bem, a nossa música não se restringe apenas ao cancioneiro a partir dos 60, mas “MPB”, no caso, é menos um conceito fechado que uma sigla de fácil assimilação (por parte do consumidor). O volume dedicado ao forró, por exemplo, tem desde Luiz Gonzaga (“Olha pro céu”, “Numa sala de reboco”), sem e com Humberto Teixeira (“Assum preto” e “Asa Branca”), até clássicos de domínio público, como “Mulher rendeira” e “Cai cai balão” ;-) Gilberto Gil, merecidamente aliás, não fica de fora, com “Lamento sertanejo”, e nem Dominguinhos, com e sem Gil, em “Tenho sede”. O resultado, muito cuidadoso, é propiciado pelo acordeom e pelos arranjos de Toninho Ferragutti.
É óbvio que não vamos salvar as criancinhas, para sempre, do contato, inevitável, com a grande mídia decrépita da nossa época, mas não custa repetir que existem alternativas, mesmo em terrenos aparentemente perdidos, como o da música.
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