No Diário de Natal
matéria de domingo
O mais longevo projeto musical do Rio Grande do Norte completa 15 anos e recebe de presente a confecção de um livro escrito por Moacy Cirne com a história completa do Seis & Meia. O livro é bancado pelo produtor Willian Collier sem interferência de dinheiro público ou patrocínio privado. O intuito é o registro independente das declarações, histórias de bastidores e dos bons e maus momentos do projeto - hoje em seu período mais crítico desde o primeiro show, quando Niko Rezende e Pedrinho Mendes subiram ao palco de um projeto musical barato e em formato até então inédito no Estado.
O livro Seis & Meia, 15 anos: a história de uma história está 80% escrito. A previsão de lançamento é em fins de novembro. A base da obra parte de reportagens publicadas em revistas, jornais e depoimentos dos principais atores responsáveis pelo projeto e alguns coadjuvantes. Moacy ressalta que as polêmicas travadas no início do projeto entre os produtores Zé Dias e Collier ficarão de fora. "Destaco o que realmente foi importante para o projeto". Ambos foram ouvidos.
"Também contextualizo a cena cultural da cidade naquele ano de 1995: livros editados, movimentos culturais... O Seis & Meia surgiu em período sem opção de projetos musicais. O Pixinguinha tinha acabado. Depois veio o Nação Potiguar". Moacy menciona o Seis & Meia na Paraíba - iniciativa de sucesso e uma das contribuintes pela manutenção do projeto no Rio Grande do Norte, quando artistas nacionais convidados aceitavam os cachês defasados pagos pelo projeto local por causa do ciclo compensatório de três shows nos Seis & Meia de Campina Grande e João Pessoa.
Moacy destaca também momentos históricos e curiosos do projeto. Fatos como o desmaio de Elza Soares no camarim no TAM após um show eletrizante. "Desmaiou de cansaço". Ou o último show de Baden Powell no Brasil, no palco do Seis & Meia em Natal, dois meses antes de morrer. "Tem uns fatos engraçados, também: Collier querendo falar com Ângela Rô Rô e ela no cooper do hotel ao TAM...". Entrevistas consistentes de Zé Dias às revistas Preá e Palumbo, e a de Collier à Brouhaha também irão compor histórias e acontecências do projeto.
O livro - que será distribuído nacionalmente no meio musical - receberá prefácio da pesquisadora Leide Câmara, responsável pela feitura de textos de homenagem aos artistas locais, lidos durante anos na abertura dos shows. A orelha da obra será escrita pelo ex-presidente da Capitania das Artes, Dácio Galvão. Dácio acompanhou de perto os primeiros anos do projeto quando esteve na FJA e indicou várias das atrações do Seis & Meia. “Não será um livro grande, até pela falta de patrocínio”, ressalta Moacy.
Se há polêmica no livro são declarações pró e contra as gestões culturais. "Tem artigo de Alex Medeiros descendo o pau em Crispiniano (atual diretor geral da FJA) e outro de Bob Motta elogiando, "A última matéria do Diário de Natal será colocada na íntegra, no fim do livro como o fechamento de um ciclo com a saída de Collier do projeto", cita Moacy. O texto informa os motivos da saída do produtor, cansado do desprestígio com o projeto pela falta de repasse financeiro e os cachês atrasados - sina vivenciada em praticamente todo o período do Seis & Meia.
De Zé Dias a Willian Collier
“Zé Dias foi importante principalmente quando o Seis & Meia passou por momentos difíceis”. A declaração de Collier resume o tom editorial do livro. O produtor diz ter sido o idealizador do Seis & Meia. Foi quem apresentou o projeto à direção da Fundação José Augusto, em 1995. Zé Dias chefiava o departamento de projetos culturais e coordenou o Seis & Meia no primeiro momento. Collier ingressava com a empresa produtora responsável pelo pagamento dos artistas. “Houve um mal entendido no show de Fagner e eu demiti Collier”, sintetizou Zé Dias.
A empresa substituta foi a Cabugi Eventos. “Quando houve a campanha pra prefeitura, disputavam Fátima Bezerra, Wilma de Faria e João Faustino, que era do PMDB. Declarei meu voto à Fátima. Henrique Alves (dono da Cabugi Eventos) não gostou e retirou sua empresa do Seis & Meia. Gostei foi de Garibaldi, que me manteve no cargo”. A empresa da produtora Iraci Azevedo (última coordenadora do Natal em Natal) assumiu o posto. Naquela época, a iniciativa privada bancava o projeto. “Woden aceitou o projeto sob condição de não gastar nada”, disse Zé Dias.
Durante os primeiros quatro anos, o Seis & Meia esteve sob o olhar de Zé Dias e colecionou histórias memoráveis. “Quando o projeto estava ‘quebrado’, Fagner aceitou tocar de graça. Fez duas sessões. A primeira lotou e pagamos os débitos. A segunda seria para pagar seu cachê. Mas ele doou à manutenção do Seis & Meia. Não fosse Fagner o projeto acabaria ali”. Zé Dias cita ainda a construção do Teatro Lauro Monte Filho, em Mossoró. “Funcionava ali um templo da Igreja Universal do Reino de Deus, em terreno alugado do município. Mário Rosado, quando assistou um show do Seis & Meia, ficou empolgado e mandou construir ali o teatro”.
Governo assume projeto
Zé Dias foi surpreendido com a substituição de Dolores Portela por Olga Aranha, na chefia do Centro de Promoção Cultural da FJA. “Discordei. Quando Olga me mandou à rua em busca de patrocínio para o Seis & Meia, eu perguntei: ‘E o que você vai fazer?’. Ela respondeu que era a nova diretora do Centro. Arrumei minhas coisas e pedi demissão sem nem falar com Woden”. Foi quando Collier reassume a produção do evento. E junto com ele, o interesse do governo em patrocinar o projeto.
O Seis & Meia caiu de produção com a interferência mais direta do Governo. “Trabalhamos com Parceria Público-Privada quando sequer se falava nisso”. UnP e Cosern foram algumas das parceiras. Mas cachês já eram atrasados. “O melhor momento aconteceu com a Telemar, em 2004, porque foi via Lei Câmara Cascudo, que desburocratizava muita coisa”. Vieram Zélia Duncan, Dominguinhos, Luís Melodia… “Mas desde sempre enfrentamos esse entrave no repasse da verba governamental”, lamentou Collier.
Os dois piores momentos na opinião do produtor foram os últimos meses das gestões de Fernando Freire e a atual administração de Iberê. “Fim de governo e o dinheiro restante serve para quitar débitos. Não sobra nada à cultura. François Silvestre uma vez disse: ‘Enquanto faltar mertiolate e bandaid nos hospitais, a cultura nunca será prioridade’. É verdade”. E assim o projetou sobreviveu por pelo menos uma década. “Concordo quando Zé Dias diz que pra produzir o Seis & Meia só com capital de giro (pra pagar os cachês atrasados do próprio bolso e esperar o pagamento depois) ou com patrocínio privado”, concluiu.
Futuro incerto
Declarações do produtor Willian Collier sobre falta de verba e desprestígio governamental com o projeto Seis & Meia, publicadas na capa deste caderno na edição de terça-feira, parecem pouco preocupar a diretoria da Fundação José Augusto. A reportagem procurou o titular do órgão e a assessoria do Governo do Estado por dois dias e nenhum posicionamento foi dado a respeito da possibilidade do cancelamento do projeto.
O diretor geral, Crispiniano Neto estave em Brasília e não atender as ligações. Também receberam chamadas o diretor adjunto, Fábio Lima, e o chefe de gabinete, Gilson Matias. Nenhum retornou, mesmo sob pedido da reportagem à assessoria da Fundação. A assessoria do Governo – apontada por Collier como culpada pela falta de repasse financeiro – transferiu a palavra à Fundação.
Nesse “jogo de empurra” entre Governo e FJA, o Seis & Meia – finalizado dois meses antes e com seis cachês de artistas em atraso – permanece na “corda bamba”. O desinteresse pelo posicionamento a respeito do tema comprova as palavras do produtor, que anunciou sua saída. E transferem à próxima gestão governamental a responsabilidade da manutenção do projeto, de preferência, com novo formato para evitar a falência do Seis & Meia.
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