sábado, 27 de fevereiro de 2010
Entrevista - Cláudio Rabeca
Rabequeiro nascido e criado nos mares natalenses encontra oportunidade nos mangues da cultura recifense
Não foi só o herói indígena Felipe Camarão quem nasceu e se criou próximo ao mar natalense e foi à luta em Recife. Um rabequeiro chamado Cláudio enxergou de antemão a fraqueza cultural da cidade de Cascudo e buscou oportunidade onde há. Em terras pernambucanas, conheceu o folguedo Cavalo Marinho, o som da rabeca de Siba, Antônio Nóbrega, as cirandas, a cultura popular da região e fez carreira (nos dois sentidos).
Cláudio mergulhou na cultura pernambucana e saiu enlameado. O mar de Pernambuco é mangue. Mar mesmo, do sal da gema, só em Ponta Negra, onde nasceu e guarda saudades. E essa mistura de costumes rende um suco de cajarana com baião-de-dois. O baião, aliás, é o mote do CD Luz do Baião. E a rabeca, a atriz que rouba a cena.
O CD resgata o baião esquecido pelo forró e traz o diferencial do som desbotado da rabeca – som que parece brotar das terras da Zona da Mata Norte pernambucana –, em diálogo íntimo com a sanfona, o violão de sete cordas, a flauta transversal e o clarinete. Ainda o bozó de sete cordas e iniciações no coco – de origem potiguar, e o maracatu, típico de Recife.
A voz de Cláudio Rabeca parece sintonizada ao seu instrumento. É foz de forrozeiro, daqueles verdadeiros, tradicionais. As letras passeiam pela poesia. Bebem das cirandas, dos costumes e folguedos populares. Tem um quê de melancolia ao abordar as simplicidades e durezas de pescadores, dos catadores de caranguejo... “Um homem e um caranguejo, comendo o mesmo sobejo”, diz a canção intitulada Josué.
Se Cláudio compõe a música Trovão Azul no Frevo, também escreve Cajarana, onde fala da relação com o sertão potiguar. “Ouvia as histórias de um tio caçador (Zé Ribeiro) sobre a Serra da Cajarana, em Santana do Matos”, conta. A música diz: “Vento já trouxe o som de coisa assombrada. É noite de fulôzinha, caipora de madrugada. Tacacá, peba ou gato maracajá. Cachorro que acua cabra, não presta para caçar”.
Cláudio é desses potiguares sequer conhecidos em sua terra. Ele mesmo sabe apenas de Babal e Khrystal, “a quem tiro o chapéu”, diz. O rabequeiro segue no Recife prestigiado pelo governo pernambucano. Toca no Cavalo Marinho Estrela de Ouro, da Cidade de Condado. Quem conta a história é o próprio:
Entrevista – Cláudio Rabeca
O mar de Natal tem a mesma cor do maracatu recifense? Ambas estão bem presentes em suas composições...
O mar do litoral do RN tem muita beleza, assim como o maracatu pernambucano. Morei uns 16 anos em Ponta Negra, onde vivenciei as pescas por arrastões e tantas outras coisas. A música Sábio Pescador me remete a esta paisagem. Toco há oito anos no Maracatu Nação Estrela Brilhante, por isso a vontade de gravar a música Rei Bantu, de Luiz Gonzaga e Zé Dantas, que foi gravada originalmente em 1950. Na minha versão convidei Mestre Walter para cantar comigo, grande amigo e mestre de Maracatu de Baque Virado.
Recife rima com rabeca? Pernambuco rima com oportunidade? Por que você saiu de Natal?
Recife rima principalmente, com cultura popular. A rabeca aqui é muito forte devido a nomes como Siba e Antônio Nóbrega que beberam na fonte do folguedo Cavalo Marinho, onde a Rabeca tem grande importância. Pernambuco virou vitrine cultural. Aqui a cultura popular é imensa e influencia muita gente. O governo não é besta, por isso os investimentos em cultura aqui são bons. O problema é que tem muita gente boa fazendo música, deve ser difícil dar oportunidade pra todo mundo. Meu CD Luz do Baião, foi patrocinado pelo governo do estado, em edital anual. Sem esse tipo de apoio, nunca poderia ter realizado um produto com tanta qualidade. Quando sai de Natal, passei a valorizar mais nossa cultura nordestina, sentia muita saudade e queria voltar, mas sabia que Recife era melhor de oportunidades na música, por isso a escolha.
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