A nostalgia vive também o não-passado. A praia abandonada recomeça – novo encanto. Lembranças ressurgem claras. Como o tapete de areia. Uma anterioridade intocável. Um mundo incabível ao abraço do palpável. A natureza embora viva sequer desconfia da maravilha da revisita. O tédio das ondas de mesmo destino ceifou qualquer visão além. São como as catraias inertes sobre as toras de coqueiro. A espera é a mesma. E há outros passantes mais alegres. Ainda estusiasmados com o belo natural. Sou apenas o que espreita. Porque seria notado?
A praia já não respira como antes. Persegue a eternidade sufocada. Os arrecifes recebem chorosos em solidão o rebentar das ondas. Já não há a flora ou fauna de outrora. O lixo de outros mares espantou a natureza viva de minha infância. Talvez por isso o cansaço da orla, alimentado pela desesperança dos dias de sol. A alegria alheia dos visitantes de setembro antecipa a estação da dor. Os veraneios são intermináveis à praia-refúgio. Antes a solidão dos dias invernais. É quando a alma congela e a tristeza dormente descansa da euforia forçada.
A melancolia da praia-refúgio é de cais de porto. Tem alma faroleira. E balanço lânguido como as palhas de coqueiro. Não é a melancolia freudiana, depressiva. Está intimamente ligada à alegoria, ao contido, ao reprimido, às esperanças torturadas. Uma alma perfumada pelo que um dia Kierkegaard apontou como inerente ao humano. Mas permanece ainda a sabedoria do eterno como sustentáculo dos dias. A praia lamenta tão somente o destino eterno das rotinas de maré. E o mar, com suas paredes de vidro, rodeiam um universo infinito de solidão.
O exercício de viver a melancolia acalma os dias intempestivos. A violência das ondas é empurrada pelos ventos ainda fortes. Nem de longe reflete os sentimentos da praia. São ventanias ainda de agosto; passageiras. Não se coadunam com a angústia nativa da praia ou do mar. Provocam o mar revolto e se afugentam em outros recantos tempos depois. É quando o mar me desperta o medo; quando está fora de si. O mar da praia-refúgio sente preguiça de sofrer e alongar a vida. Não é o mesmo das ondas bravias de agosto e setembro.
Talvez eu tenha um pouco de mar; daquele mar. Navegante de minhas lembranças de menino, respiro a brisa do lençol verde-escuro e guardo na solidão minha força maior. Sinto-me eterno no escuro da noite; mais leve nos dias de segundos congelados. A vida contemplativa carece da melancolia. Não é à toa, Goethe afirmou ser a melancolia uma submersão em um mar de sensibilidade. Esperarei os dias angustiados de calor passarem e levarem com os seus a doce ilusão da alegria para um reencontro mais íntimo entre meus sonhos infantis e a praia eterna entediada.
[image: Quando usamos a palavra em cima?]
Quando usamos a expressão "em cima"? Fique por dentro do significado e das
diferentes situações em que esta pal...
Há 5 horas
belo texto. voltarei.
ResponderExcluirmgp