O clima na redação nem está melancólico, triste. A foto de despedida mostrará semblantes alegres à posteridade. Minha impressão é de que ninguém percebeu o momento histórico, de mudança do Diário de Natal, da sede de tantas batalhas travadas, para a Zona Norte - um prédio suntuoso, moderno, com cara de novidade.
Lá embaixo, as pilhas de jornais do arquivo são levadas em caminhões. Jogam as coleções sem nenhum sentimento. Parecem coveiros enterrando caixões. Se soubessem o valor daquelas peças... Outros adentram suas salas como em dias comuns, indiferentes ao momento.
Soube agora que "Seo" Arino veio ontem se despedir do prédio em que trabalhou 50 anos. Acho que Seu Arino guarda o mesmo sentimento meu. Claro, tenho lá apenas seis anos de vida - uma criança ainda de muitos porques. Mas nasci aqui e ainda me crio por aqui, já com alguma rebeldia adolescente, alguma maturidade adulta e muito o que aprender. Ainda me vislumbro como uma criança.
Vendo os caminhões em idas e vindas levando material, armários, jornais, tenho a sensação de estarem transportando história. Seguem ali a alma da Rádio Poti, o idealismo de Djalma Maranhão, o pioneirismo de Luiz Maria Alves, o sarcasmo saudoso de Machado, vitórias e derrotas de tantos que vestiram a camisa do jornal...
Domingo estarei lá, no prédio com semblante de progresso. No plantão, estrearei as primeiras matérias elaboradas a partir da nova sede. A galera está animada, mesmo pela distância incômoda. Eu também. Mas o que fica é esse sentimento de nostalgia - aquela saudade dolorosa.
Segue pra lá uma galera nova, competente, cheia de energia e vontade de tocar pra frente a jangadinha do jornal impresso, frente aos saveiros e navios da internet. Mesmo os mais antigos, em novas funções, parecem renovados em suas aspirações. No todo, é um projeto ousado, bem encaixado com a modernidade e proposta do novo espaço.
Mas o progresso que atropela memórias parece antagônico à simplicidade. Vou sentir falta. E desconfio que lá não caberia a cena cotidiana de chegar à redação, acenar com apenas um "digaê Seo Arino", e ele responder, de supetão: "Òpa, tudo na santa paz de Deus!". Era o começo do meu dia...
*Para Raquel, no Dia da República (aniversário).*
Raquel Olegário hoje o feriado tem outra razão,
é o teu dia, a tua essência celebrada com emoção.
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Há 8 horas
Belíssima crônica, amigo!
ResponderExcluirE...vida longa ao Diário de Natal e ao Diário do Tempo!
É um misto de tudo isso, tristeza e alegria, saudade e medo. A mudança para o novo prédio é a transição material da mudança que passamos há quase um ano. Mas isso não signifca que vamos enterrar as ótimas lembranças que reunimos por aqui. O prédio fica na av. Deodoro (por pouco tempo), mas a história já feita vai com a gente (os responsáveis pela nova) não importa aonde estejamos. A situação que você descreveu é como um velório no qual velhos amigos se encontram. Rir ou chorar?
ResponderExcluir- Gabriela Freire
Também sinto saudades das saudações de Seu Arino e principalmente do caual "O quê?" de Roberto Machado. Mas acho que a modernidade não passa por cima da história. A ela se soma para continaur construindo o que a gente um dia vai ver que também virou hitória. Belo texto. Me emocionou.
ResponderExcluirNo primeiro período da UFRN virei assídua frequentadora da hemeroteca do setor V. Corria pra lá nos intervalos ou não. Simplesmente ia. Foram lá os meus primeiros contatos com o Diário, com o Poti, depois de uma vida inteira, influenciada por meu pai, só lendo a Tribuna. Foi na hemeroteca que comecei a ler suas crônicas no domingo e me apaixonei por seu texto. No quinto período entrei como estagiária no DN. Sentei numa cadeira cujo dono não estava. Era sua cadeira, mas eu não sabia. Ao sair ara uma de minhas primeiras pautas na rua, vi um rapazinho louro, baixinho, com cara de quem trabalhava no setor de informática. Era vc. Pedindo carona pra ir pra Fiern. Só no caminho descobri seu nome. E me enchi de felicidade por conhecer um ""ídolo''. Sérgio, até hoje essa admiração pelo q escreve existe. Porque dificilmente alguém me faria ter vontade de chorar com um texto, às 3h53 de uma madrugada de insônia braba, depois de um pescoção de sexta-feira. Um pescoção na Tribuna e não mais no Diário. Tenho certeza de que se nesta sexta-feira, 26 de março, se eu estivesse no velho DN da avenida Deodoro, estaria cheia de saudade e de tristeza. Com os jornais sendo jogados, com as lembraças que ficarão pra sempre da maior escola de jornalismo que eu tive. Lembro também do jeito de cumprimentar de Seu Aurino. Tinha vergonha de cumprimentá-lo as vezes. Mas me olhava com um sorriso tão simples e eu não resistia. Soltava um oi quase inaudivel e ficávamos quites. Seu Aurino, Zanzo, seu Machado, Marlucinha, vc..Não dá pra contar quantas figuras marcantes encontrei pelos corredores nos meus quatro anos de vida dedicados com todo o amor possível para um jornalista ao DN. Estranho né? vcs começam a trabalhar pra valer na nova sede em março. Mesmo mês em q houve reviravolta dificilmente sonhada por algum de nós. Vcs vão começar a trabalhar a dois passos da minha casa. E eu, da janela, olhando. Não com saudade. Porque minhas lembranças ficarão na avenida Deodoro. Mas cheia de curiosidade em relação à estrutura nova e ao futuro.
ResponderExcluirAbraços.
Renata Moura