segunda-feira, 24 de maio de 2010
Contra a bruxa do mercado editorial
Terceiro livro de Juliano Freire traz aventura de herói mirim no sertão do Seridó com pitadas de cordel
Perseguido por uma figura misteriosa e cheia de artimanhas, um menino sertanejo conta com a ajuda de seres mágicos para enfrentar uma maldição que o tornou a criança mais triste do lugar onde mora. Este é o mote de Felizardo Contra a Bruxa da Feira, título que remete à literatura de cordel, mas que na prática traz uma história pontilhada de magia, monstros, fada, bruxa e um cachorro esperto demais. É o terceiro livro do escritor e jornalista Juliano Freire de Souza dedicado ao público infantil e infanto-juvenil. O lançamento está marcado para esta segunda-feira, às 18h, na Siciliano do Midway. Com projeto gráfico da Infinita Imagem, a obra tem ilustrações de Tomaz Gonzaga, jovem promessa das artes gráficas do Estado. O livro tem como cenário a região do Seridó e suas paisagens. A marca da história é a aventura e a ação. Gente simples que de repente é vítima das maldades de uma mulher de quase dois metros de altura, enigmática e cheia de segredos. A apresentação do trabalho é feita pelo escritor Nei Leandro de Castro. Abaixo, o escritor comenta de inspirações, mercado leitor, tendências e importância do mercado editorial para o livro infantil e infanto-juvenil.
Entrevista – Juliano Freire
O enredo de seus livros é inspirado em obras literárias voltadas ao segmento infanto-juvenil, parte de algum mote dado sem pretensão por seus filhos, ou de temáticas que você julga necessárias repassar a este público?
É pura imaginação. O que vem primeiro mesmo é o enredo, começo-meio-fim. Dá uma agonia quando a gente tem a ideia na cabeça e falta tempo de desenvolvê-la. Parece um filme congelado na mente. Agora, durante o desenrolar da produção, os valores e princípios estão inseridos no texto. O público infantil é inteligente e várias vezes enxerga aspectos que nem o autor percebeu. Isso é o maior retorno de um escritor: ver seu trabalho ser comentado, analisado, ou saber que uma criança saiu de casa para passear com seu livro a tiracolo, um companheiro das primeiras letras.
Qual o cuidado extra, o diferencial e o atrativo na elaboração de textos para crianças e adolescentes?
Ilustrações são elementos de apoio que só enriquecem os livros. Comparo a uma carpintaria. Tive a sorte de contar com ilustradores que conseguiram captar a ideia de cada personagem. Em “Doninha e o Marimbondo”, o Jameson Magalhães deu uma feição aos personagens centrais que os aproximaram dos leitores mirins. Roberto Melo propiciou ao “Pereyra – o menino bom de bola” fisionomia realmente humana, social, realista. E agora, o Tomaz Gonzaga emprestou seu talento para ilustrar “Felizardo contra a bruxa da feira”, com ares de quadrinhos, raios, monstros, fada, efeitos luminosos, com técnica apurada. O diferencial é dar uma marca própria a cada estória. E o atrativo é captar a emoção de quem lê. Na cena em que o Felizardo chora copiosamente, formando um lago de lágrimas, isso é bem perceptível.
Qual a resposta obtida com os dois primeiros livros?
Pessoalmente, foram sonhos realizados, concretizados em palavras, cores e papel. Doninha trouxe um resultado local, duas tiragens, adoção do livro por três anos seguidos pelo Colégio Contemporâneo, palestras em escolas, proximidade com leitores. Se é importante à criança conhecer o escritor, para este é muito mais valioso ainda colher as impressões. Certa vez, fui sabatinado por dois alunos do 5º ano do mencionado colégio e foi cada pergunta... A capacidade deles é superior ao que a gente pensa. E “Pereyra” foi publicado pela Cortez Editora e tem sido apresentado em várias feiras literárias pelo país. Apareceu na ESPN Brasil, no Museu do Futebol do Pacaembu, e colégios de outros estados o adotaram.
Nesse intervalo entre a publicação do primeiro e terceiro livro, você já sente a perda de espaço do livro para o e-book, ou entre o material impresso e o eletrônico? Você já pensa em um quarto livro também lançado via mídia eletrônica?
Penso em uma maneira de conciliar os dois mundos, o do papel e o virtual. O problema é que no meu caso, tenho a dimensão criativa do projeto, mas é preciso ter a veia comercial. O papel eterniza a obra, mas não dá para descartar o espaço eletrônico. Esses trabalhos poderiam ter maior visibilidade se estivessem inseridos na cultura da internet, do e-book. Tenho textos de um 4º, de um 5º livro, prontos. Quem sabe nos próximos, possamos ter as duas vertentes ou trazer alguns dos primeiros para a via eletrônica. Mas, acho que o livro impresso ainda tem boa estrada pela frente, correndo em paralelo ao meio virtual.
A literatura infantil ainda é incipiente no Brasil? A literatura de cordel seria um caminho atrativo e pouco explorado nas escolas?
O livro parece tema de versos de poesia popular. Existe muito preconceito contra o cordel, justamente por ser simples, fácil e de raiz tão brasileira. Acredito que o universal começa quando ecoamos a voz de nossos sertões primeiros. Não diria que a literatura infantil seja incipiente, mas precisa de maior apoio dos poderes públicos. É um ramo mais caro. Exige ilustração, produção, editorações atraentes. Às vezes se chega a gastar valores consideráveis para se fazer um livro deste. E a literatura para crianças é subestimada. Há quem ache se tratar de um gênero menor, talvez porque não traga o ranço da vaidade intelectual. Ora, formar os novos leitores no nascedouro gera um compromisso muito maior. Como tudo na vida, se começa pelos degraus inferiores, não pelas cúpulas. Mas as dificuldades nos gêneros infantil e adulto são semelhantes. O começo é repleto de obstáculos e pouquíssimos conseguem superar os custos.
Há mercado para este segmento?
Livro no Brasil ainda é artigo de luxo, por mais que haja isenção de impostos em alguns insumos. Você vê um trabalhador lendo um livro na parada de ônibus? Algum pobre comprando exemplares para seus filhos na livraria? Não estou falando somente de dinheiro, mas de visão. Não se faz uma cidade, um estado e uma nação melhor sem a democratização da leitura, do acesso, da continuidade. No geral existem aqueles que não querem que o povo se eduque, leia mais, conscientize-se, seja um crítico que incomode. Se minha mãe não tivesse lido para mim, na infância, contado estórias, estimulado a gostar de ler, eu hoje não estaria atuando nesta área, teria ojeriza a livros. O prazer do livro começa em casa, depois vem a escola, as políticas públicas, os incentivos. Por isso tudo acho que quem faz livro no Brasil é teimoso, resistente e sonhador.
Lançamento literário
Livro: Felizardo contra a bruxa da feira
Onde: Livraria Siciliano, Midway Mall
Data e hora: segunda-feira, às 18h
Preço: R$ 28
* Matéria publicada ontem no Diário de Natal
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