Baião-de-dois, picado, buchada, cachaça e mais uma roda de sanfoneiros sentados em cadeiras simples de madeira em homenagem ao criador do forró autêntico e expressão máxima da simplicidade sertaneja. Talvez fosse assim o aniversário de Luiz Gonzaga, se estivesse vivo. Seu Lua completaria 98 anos hoje. Um documento aqui e outro ali, e se monta uma biografia e uma discografia das mais impressionantes do cancioneiro musical do mundo. Pouca gente sabe, mas foi Gonzagão o idealizador do casamento originário do forró, entre a sanfona, o triângulo e a zabumba. O mais interessante é saber como surgiu a ideia. O depoimento é do próprio Gonzaga, em 1973 no programa comandado por Julio Lerner, o Radiola TV (TV Cultura). As imagens em preto e branco traz, além do relato, a figura de Dominguinhos ainda meninote e o filho Gonzaguinha entrevistando o Rei do Baião.
“Por que utilizar somente o triângulo, o zambumba e a sanfona; por que só o trio?”. E o pai responde: “Eu vinha cantando sozinho, mas eu precisava de um ritmo, porque a música nordestina precisava de côro. Côro que eu digo é côro de cachorro, côro de bode; um negócio pra bater, que no Rio de Janeiro se usa côro de gado, né? Então, primeiramente eu criei o zabumba baseado nas bandas de côro lá do sertão, aquelas que nós chamamos de esquenta muié. Mas a zabumba só... eu fiquei assim com a asa quebrada. Eu precisava descobrir um instrumento bastante vibrante, agudo, pra brigar com a zabumba. Até que vi passar no Recife, um menino vendendo cavaco chinês, com aquele tubo nas costas, tocando o tinguilin, como ele chamava. Aí, ele fazia aquilo com uma certa cadência, né? Pronto, achei o marido da zabumba”.
A frieza do diálogo entre pai e filho que até viveram relações tumultuadas em certa época, foi quebrada em seguida, quando Gonzaguinha pergunta da infância pobre do pai lá em Exu, sertão pernambucano: ”Minha infância foi pobre, mas não infeliz, porque uma criança não pode saber que é infeliz desde que tenha o carinho de seus pais. E isso não me faltou em casa. Você também sabe bem disso”. E nesta simplicidade tão rica, Gonzagão cantou os sofrimentos e costumes de sua terra e mostrou ao mundo um novo ritmo. Mesmo emanado dos rincões nordestinos, o Forró, Xote, Xaxado ou Baião é pouco considerado representativo da música brasileiro, muito mais exportador de Bossa Nova e do Samba. Mesmo Asa Branca (composta em parceria com o advogado cearense Humberto Teixeira) sendo quase tão regravada quanto Garota de Ipanema.
Homenagem em NatalE o Rei do Baião nascido em 1912 deixou marcas na música potiguar, nos acordeões de Zé de Elias e Manoel de Elias, naqueles tempos em preto e branco; na música de Elino Julião; nos meninos do Meirinhos do Forró, para citar a contemporaneidade. E também na biografia do compositor potiguar Severino Ramos. “Gonzaga estourou de vez no Brasil quando gravou Ovo de codorna, de Severino, após Caetano gravar Asa Branca, no exílio. Gravou 13 músicas de Severino”, lembrou o produtor musical José Dias. Ele organiza para amanhã uma homenagem a Gonzagão dentro do projeto Praia Shopping Musical. O compositor e intérprete Arnaldo Farias fará uma noite inteira de repertório de Gonzaga. “Será um momento extraordinário para esse artista incomporável, que desceu a serra do Juazeiro para conquistar o mundo”, disse Zé Dias.
Gonzaga viria a morrer em 2 de agosto de 1989. Ele sofria de osteoporose. Morreu vítima de parada cardiorrespiratória no Hospital Santa Joana, em Recife. Seu corpo foi velado em Juazeiro do Norte (a contragosto de Gonzaguinha, que pediu que o corpo fosse levado o mais rápido possível para Exu, irritando várias pessoas que iriam ao velório e tornando Gonzaguinha "persona non grata" em Juazeiro do Norte) e posteriormente sepultado em seu município natal.
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