Única loja do Centro da Cidade a vender CDs originais precisou se adequar à época para se manterO tempo passa, o tempo voa e a indústria fonográfica já não está numa boa. Os tempos são digitais e a pirataria já não é aquela cambada de corsários saqueadores transportados em navios. Viver ou sobreviver da venda de CDs originais é coisa tão rara quanto aquele tão garimpado vinil do Impacto Cinco, Lágrimas Azuis (1975). No Centro da Cidade há um sobrevivente do naufrágio do comércio de CDs. A Discol se instalou na Rua João Pessoa em 1976 e atravessou o tempo vestindo a camisa da moda em cada década. Adequou-se à modernidade, se desdobrou em outros serviços e mantém viva a originalidade da loja: o segmento rocker.
Luiz Brás de Araújo vestia ontem uma camisa com estampa do CD Pulse, do Pink Floyd. Trabalhava na transposição do som de um vinil para a mídia digital. Nos fundos da loja, um banner com serviços de tatuagem. E na vitrine, vestuários da moda surf wear. Tudo bem, a loja precisou se camuflar (ou se adaptar, ou criar) outros serviços. Foi a maneira encontrada por Luiz para se manter e continuar a venda de CDs – ainda o serviço mais rentável da loja, seguido pelas camisas com estampas de bandas, álbuns e personagens do rock e o trabalho de digitalização de mídias analógicas para digitais. A moda “dos boys do skate” também ajuda e mantém o público de décadas atrás.
Ainda na década de 70, quando a Discol pertencia a uma rede de lojas, as paredes eram verdadeiras vitrines preenchidas por coleções de vinis. “Às vezes chegam clientes antigos, jornalistas daqueles tempos e alguns lembram até a seqüência e o local exato onde os vinis estavam expostos na parede, e ainda citam os nomes”. E naquela época, continua, Luiz, a preferência era Deep Purple, Led Zeppelin, Emerson Lake & Palmer e outros do rock progressivo da libertária década de 70. Na década consumista de 80, os vinis continuaram reis do mercado, e a loja acrescentava apenas acessórios de instrumentos musicais para aumentar a renda.
Foi apenas nem meados da década de 90, com a chegada do DVD, a popularização dos computadores e a liberação dos downloads que a Discol foi pressionada a rever seus conceitos. A rede de lojas com sede em Campina Grande foi desfeita. Luiz, como gerente da unidade de Natal, comprou a loja e iniciou as modificações. Inseriu vestuário voltado ao maior segmento da clientela da loja: jovens roqueiros. “Também senti o lamento dos clientes em perder seus vinis e fitas K-7 e comecei a digitalização desse material”. Vinil e Fita K-7 para CD, VHS para DVD. Há cinco anos também oferece tatuagens. “É outro serviço que também tem a ver com a nossa clientela”, frisa.
“Pelo próprio carinho que adquiri com a loja precisei me moldar ao mercado para manter o comércio. São 37 anos de dedicação (ele veio de Campina Grande). Se antes vendia vinis de rock, hoje vendo desde a MPB ao brega, passando pelo rock, forró. O público é mais eclético. Vem desde o senhor de idade em busca de um CD de Altemar Dutra a um ‘boy’ atrás de um skate”. Outro serviço procurado é a digitalização. Luiz adquiriu o know how de quem trabalha com vinil há quase quatro décadas. “Veja que o tocadisco é pregado na parede para evitar o balançado mínimo do móvel e o conseqüente ruído. Junto com a conexão coaxial direto no amplificador produz um som perfeito para o CD”.
Se as lojas de outrora viviam razoavelmente bem apenas de um segmento de público, hoje Luiz não pode e nem gosta de escolher. Se sua preferência musical é o rock, o som saído dos amplificadores colocados quase na calçada da Rua João Pessoa para chamar a atenção e atrair público é o famigerado forró elétrico (ou eletrônico?). No fim da manhã, as boas serestas de antigamente. Só nos fins de tarde o rock preenche o som daquele trecho histórico da Cidade Alta, vindo lá da Discol. “Antigamente era ponto de encontro de estudantes do Churchill e Atheneu, se discutia música. Aqui e acolá ainda chegam velhos clientes saudosistas para lembrar aqueles tempos”. Tempos presos nos braços seguros do passado e de saudosas memórias em preto e branco.
* Matéria publicada no Diário de Natal
Gravei uma porrada de fita K-7 e naquela época ninguém brigava por ser pirata...
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