Por Astier BasílioNo Jornal da Paraíba
Não existem fórmulas que garantam uma boa poesia. Não há receitas. O fato de Marize Castro, por exemplo, escrever poemas curtos, econômicos, apostar na simplificidade não dá nenhuma garantia de que seu trabalho poético seja bem realizado. O que faz Lábios - espelhos (Una, Rio Grande do Norte, 2009, 97 págs.) uma obra de qualidade é algo mais do que a combinação de um receituário seguido à risca. Não. É algo imponderável chamado talento.
Marize não se preocupa em ostentações. Veja o poema “Deus é Mundo” em que ela diz: pequenas mortes acompanham-me/ Desamparo-me a cada página/ Ela me disse: Deus é o mundo./ Desde então, não me encolho mais./ Amplio-me. Há, neste curto texto, dois eixos fundamentais. O primeiro, a referência a um eu-lírico, exteriorizado em terceira pessoa, denominado de “Ela”, referência que atravessa vários textos. O outro eixo, ou melhor, mais a revelação de uma estratégia, mostra uma poeta que esconde suas intertextualidades, que aposta no simples, é que “pequenas mortes”, principalmente no idioma francês, é uma metáfora para orgasmo, elemento que ilumina a temática erótica e amorosa de seus textos curtos e fulminantes.
Quem é essa “ela”? Essa “ela” que se insurge (se eu não escrevo, ela me engole/ come meu útero./ Meu cérebro...) que, por que não dizer, se metamorfoseia em várias outras, multidão de uma só que canta e que anuncia: conduzo águias/ tropeço em harpas/ troco em harpas/ troco anáguas no jardim/ onde os amantes são sepultados. Tentando, em vão responder a essa pergunta, a de quem seja “ela”, a melhor resposta não é decifrar o enigma, mas de contemplar o enigma, beijá-lo, como sugere o título, Lábios - espelho, uma gradação em camadas, uma caixa de pandora luminosa e, ao mesmo tempo, opaca, pois, a transparência de Marize ilusoriamente revela. Eis o jogo, como sugerido em “silente”: sinto urgência em dizer: calo.
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