quinta-feira, 1 de novembro de 2007

O progresso e Santa Rita

É com pesar que leio a notícia de que minha praia-refúgio já é mira dos altos empreendimentos imobiliários. É notória a valorização daquelas beiradas de mar. As cifras são milionárias e conhecidas de qualquer nativo. Mas até então, amigo leitor, Santa Rita vivia de vislumbres. Extensas áreas ainda abrigam apenas a mata rasteira e continuam coadjuvantes da beleza do mar. É a paisagem característica da praia: o verde do mar e as alvas areias, ponteadas por coqueiros.

Mas a notícia traz o chumbo daquelas verdades mais doídas. Um complexo imobiliário com um hotel, um condomínio horizontal e mais 3,2 mil apartamentos serão erguidos sobre minhas areias. E digo minhas, amigo leitor, porque miro aqueles chãos há mais de 25 anos. E até então, a praia ressentiu-se do progresso – primo-irmão do tempo. É o sinal dos tempos. Com pouco mais, a praia pacata e espremida ganhará ares de cidade. E na linha de frente, grandes empreendimentos estrangeiros.

Agora veja você: o mega-empreendimento é da empresa ValeroBrasil e será lançado próxima semana na Espanha, durante a Barcelona Meet Point – a feira imobiliária mais importante da Europa. Não, não cabe em minha imaginação aquela praia cercada de tédio e de balanços lânguidos de seus coqueiros, exposta dessa forma, desnuda e indefesa, à sanha dos estrangeiros. Seria preciso um nativo ou um veranista-amante daqueles alpendres à beira-mar para defender aquele pedaço de praia.

Coisa inútil, talvez. Progresso não se freia, amigo leitor. Há os que defendam, desde que de forma sustentável. Sou contra, ainda assim. O progresso apaga memórias, paisagens e muito dos costumes. A defesa primeira é a do desenvolvimento. Mas qual o preço a se pagar? Desenvolvimento também é preservação. Aos poucos seremos expulsos do nosso litoral. Santa Rita não possui sequer um Plano Diretor, como há, por exemplo, na praia de São Miguel do Gostoso. Imagino a visão do mar para aqueles jogados às periferias ou o impacto ambiental.

Tradições há aos montes. A maioria sobrevive em jogo de empurra contra o progresso. Agora imagine aquela catraia estacionada sobre toras de coqueiros, propriedade única de nativos da praia. Ela se apagará do mapa de minhas memórias. Duvido que continue ali como observadora passiva do mar. Em breve, lanchas dominarão o lugar e a linha de frente da praia será tomada não pelo ranger dos punhos das redes artesanais em seus alpendres, mas por áreas de lazer luxuosas, de piscinas e paredes de vidros, e o muito sagrado será coisa reservada a poucos profanos.

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