sábado, 23 de fevereiro de 2008

Entre pedras da praia

É inverno em Santa Rita. Não pelo atraso nas horas do relógio. Até o inverno parece apressado nestes dias nervosos. Chegou com cara de verão este ano. O calor ainda é insuportável na urbe. Em Santa Rita já se pisa em areia fria. Deve ser a vocação da praia. Não fosse os visitantes passageiros de alegria onusta, Santa Rita viveria só de inverno, como quadro parnasiano.

O vento ainda é pouco. As gaivotas voam desenganadas com a estação. As catraias adormecem estacionadas e descansam o tédio no salgado das horas. Se ali estão é porque o peixe já é pouco. As tainhas migraram para águas mais quentes em praias de verão. Bem sabem que Santa Rita afugenta a estação veraneio.

Ainda se vê um ou outro pelas beiradas da praia. São visitantes mais contemplativos, de alma faroleira. Caminham o olhar no marulhado das águas ou no céu ofuscado pelas nuvens gris. Vêem os arrecifes chorosos após pancadas de ondas daninhas. Enquanto ondas-musas deságuam milênios no alisar da areia. É quando o mar seduz a inspiração a um novo bailado. E a solidão bandida e insana entrega-se a qualquer ensejo.

O cenário em Santa Rita é de passado fugidio. Daí tantos visitantes mergulhados em solidões e nostalgias. É que a saudade, amigo leitor, é palavra que dói. Por vezes subo seus degraus e a visão do alto é de uma distância impossível. Desejo pular e abraçar minhas lembranças. De certo haverá uma mão sem luvas a me encher de afagos. Mas apenas caminho degraus acima. E a saudade daqueles mares do ontem percorre o porão das memórias mais coloridas.

Entre arrecifes da praia recosto fardos da existência. O cenário ameniza tombadilhos de uma vida navegante. É inverno, sim. O silêncio da nuvem pesada arqueja – silêncios sempre à escuta. A luz já é morena. A melancolia dissolve-se na brisa tardia. E numa solidão de pedra, uma janela sobre o mar. Vontade de um fim doce sob as águas...

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