Livro resgata a história da educação e o passado da mulher potiguar para rediscutir novas práticas sociaisGênero e Práticas Culturais: História, Educação e Literatura é o pomposo nome do livro organizado pela professora Maria Arisnete Câmara de Morais. O título demasiado abrangente esconde a essência da obra: uma historiografia da mulher potiguar no contexto sócio-educacional e cultural do Rio Grande do Norte. São 24 artigos e ensaios produzidos por escritoras, acadêmicas e jornalistas. O livro (Editora da UFRN, 278 pág. R$ 25) será lançado hoje na Cooperativa Cultural da UFRN, às 18h.
Muito da obra se explica no dizer da historiadora e ativista francesa Michelle Perrot: “As mulheres sempre trabalharam. Elas nem sempre exerceram ‘profissões’”. A abordagem dos textos conta a história de um tempo e contextualiza a difícil luta de mulheres pioneiras nas práticas educacionais e na luta pela quebra de tabus sexuais e políticos – essenciais para as conquistas vivenciadas hoje, mesmo sob o disfarce do preconceito arcaico.
Embora passeie por vários aspectos da história cultural potiguar, a educação e a tentativa de recuperar a presença feminina na História são os motes de cada linha textual. O livro pretende reacender a discussão das práticas sociais, as relações de poder e suas representações históricas. Isso para desmascarar as linhas do tempo escritas pelos homens, desde o texto bíblico até os paradigmas universais criados e impostos pelo sexo masculino, ocultando a visibilidade histórica da mulher na história da humanidade.
“O livro comemora 10 anos de pesquisa em Gêneros e Práticas Culturais. Trata da história da educação da mulher e, por conseguinte, a da sociedade. Conta a história de um tempo”, comenta a organizadora da obra, Maria Arisnete. E falar em reconstituição do papel da mulher na sociedade é remeter aos tempos de magistério – “uma das poucas carreiras de nível intelectual abertas às mulheres” durante as primeiras décadas do século 20. Ainda assim, conquistada sob gestos desbravadores. Basta lembrar a primeira Lei Brasileira do Ensino Primário (1827). A discriminação era latente. Meninas eram proibidas de estudarem matérias consideradas difíceis como Geometria e restringia a prática de prendas domésticas.
Mas a professora Maria Inês Sucupira Stamatto mostra em seu texto que foi o magistério a alavanca para ascensão feminista. “As meninas teriam mais interesse pela escolarização, visto que, para elas, a escola primária era uma alternativa para uma “ocupação” além do casamento e dos trabalhos mais desconsiderados que lhe permitissem sustento” – motivo pelo qual a área é hoje dominada por mulheres, enquanto homens tomam conta dos cargos gerenciais e administrativos.
O pioneirismo na área pedagógica, no jornalismo, na literatura e em movimentos sociais liderados por mulheres como Chicuta Nolasco, Palmyra Wanderley, Zila Mamede e Adelle de Oliveira, marcou de forma pontual e decisiva pensamentos e novas reflexões acerca do feminismo no Rio Grande do Norte. Mas no livro, novos olhares surgem a partir de pesquisas e comparativos para recriar essa atmosfera de idealismo e luta continuada, posto que ainda necessária.
Ilane Ferreira Cavalcante traz uma leitura das representações da virgindade nas décadas de 60 e 70... “Essas mulheres a que, durante tanto tempo foi negada a possibilidade de sentir e de dizer o amor e o sexo”. Ligia Pereira dos Santos escreve artigo intitulado Um possível olhar sobre o corpo negado?, rico de dados e referências sobre a violência da mulher. Ana Maria Concentino comenta “o cotidiano do jornal como espaço de formação”, ela uma das pioneiras do jornalismo potiguar, sobretudo no jornalismo voltado à educação.
Cartas trocadas no período da Belle Époque, a história de formação das bibliotecas do mundo, se misturam aos cenários locais e históricos, como o Atheneu Norte-Rio-Grandense Feminino ou a biografia de importantes educadores e educadoras potiguares para completar o arcabouço de textos que sintetizam muito da história da mulher e da formação educacional no Rio Grande do Norte.
Lançamento literárioLivro: Gênero e Práticas Culturais: História, Educação e Literatura
Onde: Cooperativa Cultural – UFRN (Centro de Convivência)
Data e hora: hoje, às 18h
Quanto: R$ 25
Contato: 9983-9463
* Matéria publicada no Diário de Natal
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