segunda-feira, 22 de junho de 2009

Aos fãs do Trio Irakitan

Publico abaixo entrevista publicada na edição de O Poti, em 14 de maio de 2006. Não é com Edil, o integrante do Trio, que morreu ontem. Mas com o único potiguar que sobrou da formação original do Trio Irakitan, Gilvan Bezerril - figura simpatissíssima.

Com Gilvan Bezerril

Nem só de baião, forró e xaxado vive a música nordestina. Um trio de origem potiguar dribla a força inexorável do tempo e resiste há quase 60 anos na estrada da música popular brasileira. Os boleros são a marca inconfundível do Trio Irakitan. Mas seu diferencial está na suavidade dos arranjos vocais, sutis, a transportar os que ouvem à cenários de luar, boemia e romantismo. E quem nunca velejou em A barca, antes que ela partisse para uma praia vestida de amargura? Ou mergulhou ‘‘naqueles olhos verdes, que inspiram tanta calma’’? É o amor cantado de forma pura, com alguma inocência, como nas serenatas de outrora.

O Trio Irakitan - nome sugerido pelo professor Câmara Cascudo e que significa verde mel ou doce esperança, em tupi guarani – também experimentou estilos variados ao longo da carreira. E talvez more aí o segredo da longevidade do grupo. Afinal, como resistir à passagem da Bossa Nova, Jovem Guarda, Tropicália, ou às músicas comerciais do tempo-hoje? A explicação pode estar nas assinaturas de alguns sambas que ganharam voz no coro afinado do Trio: Noel Rosa, Dorival Caymmi, Ary Barroso e... Nat King Cole. Isso mesmo. E quando o mito americano vivia seu auge, nos idos da década de 50.

O único remanescente da formação original do grupo, Paulo Gilvan Duarte, 76, conta, em entrevista exclusiva ao Poti, o episódio da vinda de Nat King Cole ao Brasil para conhecer o Trio, os ensaios do grupo na casa de Câmara Cascudo, o início da carreira, as primeiras apresentações na Rádio Poti e os cenários da Natal antiga, segundo o músico, ainda uma cidade romântica. A entrevista foi concecida após a apresentação que o Trio fez no TAM, dentro do Projeto Seis e Meia. Foram quase duas horas de show. Gilvan, como é chamado, ainda atendeu os fãs e o entusiasmo de sua família potiguar em seu camarim, com a mesma disposição de sua performance no palco.

O Trio é formado há 14 anos por Gilvan e os irmãos sergipanos Edildécio (Edil), no violão, e Edilson Andrade, no tantã. O percussionista Carlos Raposo marca o compasso da banda há 18 anos. E dá um toque caribenho à música. A percussão e o coro das três vozes de pouco mudou. A morte do potiguar Edson Reis de França (Edinho), em 1965, coincidiu com uma caída de produção do Trio. Nada que comprometesse a fidelidade dos fãs ou a qualidade da música. Em 1990, o outro integrante potiguar, João Manoel de Araújo Costa Netto (Joãozinho) também viria a falecer. Gilvan dedicou o show realizado na última terça-feira a eles dois. E é como se ambos continuassem no palco e o Trio Irakitan ainda fosse aquele das décadas de 50 e 60, com a mesma vitalidade vocal. E com o público não é diferente. Talvez o que falte seja um sobrado, uma janela receptiva de uma casa qualquer ou uma flor na lapela. Nada demais.

Sérgio Vilar: Como o grupo foi formado?
Gilvan: Éramos estudantes do Ateneu. Eu tinha vindo de Recife. Sou de lá. Juntamos 15 estudantes e saímos cantando em 20 e tantas cidades do interior. Quando chegamos em Areia Branca, foi quando o Trio deu seu primeiro acorde musical. Com o trio, em vez de irmos ao sul, fomos para o resto do Nordeste, depois pelo Norte do Brasil. Depois saímos pelas guianas, Trinidad, Venezuela... Passamos quatro anos fora do Brasil.

Como era Natal no início de 1950? O que tocava naquela época?Música romântica. Nós tínhamos programa na rádio Poti só de estudantes. Cantávamos de tudo; contávamos até anedotas. Mas o que agradava mesmo era a música romântica. Me parece que o Rio Grande do Norte tem uma força tremenda com a música romântica. Você viu o povo cantando conosco, todo afinadinho? Uma beleza!

Os cenários de Natal ainda influenciam a música do Trio Irakitan?Claro. A gente fica chateado quando não vem aqui. Viajamos 36 países, em três continentes, sempre levando o nome do Rio Grande do Norte.

O senhor também é artista plástico; pinta em naif. Também na pintura, há influência potiguar?
Também. Pinto as coisas do Nordeste.

Qual o segredo da longevidade?Sobrevivemos a tudo. E o Trio Irakitan não tem mídia em nenhum parte do Brasil. Nossa mídia foi o cinema, em décadas passadas.

Mas qual o segredo?
Francamente não sei. Talvez seja a maneira de cantar e escolher as músicas. O Brasil é muito romântico. Conheço jovens no Rio de Janeiro da faixa de 12 anos que são fãs do Trio Irakitan. É impressionante.

As músicas que compõem e interpretam remetem muito a uma cidade ainda romântica, à época das serenatas... Ainda cabe esse tipo de música em uma Natal tão cheia de muros?
Cabe. A música não tem idade. No Nordeste, a cidade mais musical que conheço é Natal. Tudo em Natal é muito romântico.

Como foi a escolha do nome do Trio Irakitan por Câmara Cascudo?Estávamos procurando um nome musical para o Trio. Inicialmente queríamos colocar Trio Trairi, trio... nomes de rios do Rio Grande do Norte. Aí ele descobriu a palavra Muirakitan. Mas como já havia um trio de moças, em Recife, com esse nome, tiramos o ‘‘mu’’.

Como foi o contato com Cascudo? Explique melhor essa história.
Ele era amigo nosso. O filho dele estava em nossa primeira excursão pelos interiores. Conhecíamos a família toda de Cascudo. Ensaiávamos na casa dele. Era ali na Junqueira... Deixa eu ver. Junqueira Alves? – Junqueira Aires. Isso! Cascudo tinha uma sensibilidade musical como poucos. E era uma sensibilidade bem brasileira. Cascudo foi a pessoa mais brasileira que conheci; uma figura impressionante.

Qual o maior orgulho em 60 anos de carreira?Conhecer artistas como Nat King Cole, Gregório Barros... Vários artistas estrangeiros, que tivemos a oportunidade de gravar com eles.

Como foi essa história de Nat King Cole vir ao Brasil conhecer vocês?
Ele já veio com os discos debaixo do braço. Chegou na fábrica que gravávamos, que era a mesma dele. E disse: ‘‘Eu quero gravar com esse trio’’. E era pra gravar uma música só: Andorinha Preta, uma música bem regional. Terminamos gravando cinco músicas com ele, em espanhol, português...

O Trio Irakitan tem muito da influência dos mariachis mexicanos, não?Não. Temos influência dos trios mexicanos. Quando saímos daqui (do Brasil) éramos considerados os magos do folclore brasileiro. No México, cantamos com vários trios e ficamos amigos de todos. Quando voltamos ao Brasil a gravadora pediu que gravássemos só em espanhol. Mas gravamos de tudo. O Trio Irakitan é muito eclético. Sendo bom, nós cantamos.

O senhor ainda demonstra gosto pela música.Esse entusiasmo vai até quando?O senhor não. É a segunda vez que me chama de senhor. Me chame de você, rapaz (risos). Bom, até quando
puder estarei cantando; até quando Deus quiser. Mas a música não pára; a música é eterna!

2 comentários:

  1. Mais uma vez Gilvan Bezerril por razões que talvez nem ele saiba explicar, omite os quase 30 Lp's e mais de 28 anos do meu pai Tony Santos que a pedido do próprio Gilvan e João substituira Edinho França falecido nos anos 60. Gilvan Bezerril e João Costa Neto pediram ao experiente músico Tony que liderava o Trio Guarani na época e que já havia excursionado com o grupo de Brasileiros ao lado de Sivuca, Altamiro Carillho Maestro Guio de Moraes entre outros por mais de 20 cidades da extinta Uniåo Soviética e Europa, que integrasse o Trio Iraquitan para que este pudesse continuar na sua trajetória. Graças a meu pai o trio não morreu e conseguiu todos esses anos 60 anos de carreira mencionados na matéria.
    Agora com a morte de Edildécio morre também o trio iraquitan.

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  2. Conheço pesoalmente o Tony e o Irakitan, um pernambucano que recebeu o nome do Trio porque seu pai era um gande fã. Acho que eles não deveriam deixar o Trio morrer,fazendo com que nos não perdessemos essa joia preciosa que era,é e será o famoso TRIO IRAKITAN.

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