A ferramenta Twitter arrebanha pessoas de todas as idades e promove revolução sócio-cultural
Da plantação e colheita dos alimentos a partir dos conhecimentos temporais até o lanche fastfood, o mundo caminha rumo às limitações de tempo, espaço e mastigadas. A matemática da crescente aceitação em massa das modas mais práticas é simples: menos tempo, coisas menores e mais rápidas para serem informadas, degustadas (ou engolidas). No campo antes florido da informação e agora invisível pelos bytes atemporais da internet, as grandes reportagens impressas nos jornalões, concorrem com os textos curtos dos blogs, que perdem espaço para a nova onda: o Twitter – o chamado Microblog. O limite são 140 caracteres para emitir qualquer raciocínio. E cabe a pergunta: é o suficiente?
A resposta vem seguida de outras muitas indagações. Uma delas talvez seja a principal: o que você necessita informar? Para postar o que se faz naquele momento, 140 toques no teclado já provocam perda de tempo suficiente. Muitos utilizam a ferramenta para promoção pessoal ou de sites pessoais. Outros preferem obter informações jornalísticas. Há outras possibilidades como a inserção de links, a publicidade de produtos e a comunicação integrada entre usuários. Esse último recurso ainda é pouco usual. E há teorias explicativas para isso. Em tempos de individualidades decorrentes da citada falta de tempo e insegurança, o voyerismo tem sido prática comportamental crescente.
Para o sociólogo João Evangelista, as novas tecnologias de informação e comunicação permitem a interatividade entre indivíduos cada vez mais isolados e destituídos de vínculos pessoais. Um mundo massificado e crescente, onde o indivíduo está mais confuso ante o bombardeio de informações e se acha mais fácil no seu próprio eu. “O Twitter é revelador desse isolamento. Demonstra a carência em expressar sentimentos e a esperança de ser escutado. É um pouco a manifestação da angústia e solidão contemporânea. Veja que o Twitter funciona como um diário compartilhado de forma comunitária”, opina o cientista social.
Famosos no Twitter
A divisão simplista entre os usuários do Microblog pode ser estipulada entre pessoas famosas e cidadãos comuns. Os primeiros se divertem com milhares de “seguidores”. O jornalista William Bonner (ou @realwbonner), por exemplo, pede dicas para seus curiosos de qual gravata deve usar naquele dia para apresentar o Jornal Nacional. “Eu me divirto muito com essa bobagem que escrevo, e vejo que muitos de vocês também se divertem e se surpreendem”, escreveu em uma das dezenas de “twitadas” em mais de dez horas à frente do computador. Já o cidadão comum é consumidor das veleidades dos famosos e buscam notoriedade entre amigos e visibilidade às suas atividades profissionais.
Há um terceiro grupo em ebulição no Twitter. Talvez seja o responsável pelo posicionamento da ferramenta como a marca do momento no disputado universo virtual. São empresas, instituições e profissionais – sobretudo da mídia e da política – que descobriram o potencial do Twitter como chamariz para blogs e sites onde podem ampliar e aprofundar os conteúdos ou interesses. Isso de forma rápida, prática, de fácil leitura e, dependendo do número de seguidores, de grande amplitude. Na seara local, dois políticos já promoveram entrevistas em tempo real pelo twitter e receberam forte divulgação pela mídia, ainda desacostumada à novidade.
A utilidade do Twitter
O jornalista Tácito Costa compara a utilidade do Microblog ao próprio uso da internet. “Depende muito de quem utiliza. Há sites informativos e outros não. No Twitter é a mesma coisa. Particularmente sigo apenas pessoas que possam me passar informações pertinentes para o meu trabalho profissional; encaro como ferramenta de finalidade meramente jornalística e de divulgação do meu site”. Tácito Costa mantém um dos principais sites voltados à literatura e ao jornalismo cultural da cidade. Segundo ele, ao contrário do que se estima, o Twitter colabora para o aumento de acessos a sites e portais de internet. “Não acho que o vá acabar com os blogues. Veja que muitas postagens são links que remetem a outros sites”.
O jornalista traça um panorama comparativo entre o início dos blogues e o Twitter: ambos começaram como espécies de diários íntimos e, aos poucos, se tornam ferramentas de informação. “Veja que há uma pergunta inicial na página do Twitter que pergunta o que você está fazendo. Ou seja: ele foi projetado para ser um diário. Mas tem tomado outro rumo, diferente, por exemplo, do Orkut, que se mantém como site de relacionamentos de finalidade mais íntima. Os blogues também começaram como diários sentimentais e hoje muitos funcionam como veículos de notícias”. Tácito chama a atenção para a crescente força da mídia Twitter. “Aos poucos se torna mais uma voz democrática a se juntar à mídia tradicional. E isso é bom. São mais vozes a serem ouvidas”.
Novos vocábulos
Assim como a expressão “deletar” causava estranheza há cerca de 15 anos e após algum tempo se tornou verbo da língua portuguesa devido o meteoro do avanço da internet no mundo, o Twitter já inventa das suas e promete inserir novos vocábulos à língua de Camões. Os mais velhos talvez sequer tenham ouvido falar em “tuitar” ou mesmo “retuitar”. Nos tempos das anáguas, “seguidores” tinham outra conotação que não a de acompanhar as “postagens” de amigos e famosos. E devem se atrapalhar com os diminutivos provocados pelo limite de caracteres onde o “que” é “q” e o “também” é “tbm”.
Repercussão midiática
Texto publicado no site Observatório da Imprensa por Gabriel Priolli chama atenção para o poder de difusão do Twitter. Segundo ele, em 13 de outubro, alguém postou logo cedo uma reportagem de TV portuguesa, onde a atriz Maitê Proença era duramente criticada por gracinhas e comentários infelizes que perpetrou, em matéria para o programa Saia Justa, do GNT. O assunto explodiu e as reações negativas aumentaram de tal forma que se tornou imperativo um pedido de desculpas. Às 21:58, o site do GNT divulgou vídeo gravado por Maitê, com suas constrangidas explicações ("O brasileiro é muito brincalhão, a gente brinca com aquilo por que tem afeto..."). Foram menos de 12 horas do início ao auge, para um factóide midiático de alcance internacional.
No plano local, a jornalista Michelle Ferret sugeriu a defenestração de um ocupante de cargo público em Natal em 140 caracteres. A voz da jornalista ganhou mídia em sites, blogues e conversas informais no mesmo dia. Opiniões de intelectuais e cidadãos indignados com as posturas do gestor foram manifestadas livre e democraticamente na internet e jornais impressos e provocaram a “vítima” a emitir explicações à mídia sobre suas declarações. Por outro lado – como frisou Tácito Costa – também serve à finalidade inicial: divulgar frivolidades. E provoca questionamentos alheios, como a do jornalista Mário Ivo: “esse povo do twitter q diz q vai ler antes de dormir, sei não - por q nunca aparece alguém q diz "vou fazer um sexozinho básico" e sono?!”.
* Matéria publicada domingo no Diário de Natal
[image: Quais países usam o cedilha?]
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