quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Retrato da música potiguar


Filho de Chico Elion, Kiko Chagas tocou com astros nacionais e hoje tenta sobreviver da arte em Natal

Virtuose da guitarra, multinstrumentista, autor de mais de 500 composições - uma delas encartada no CD dos 20 sucessos da banda Cheiro de Amor -, mais de 30 anos dedicados à música. Não bastasse uma vida de batalha e suor nos palcos, Kiko Chagas descende de uma família de músicos que fizeram história no Brasil, como Manel de Elias e Zé de Elias, mestres da sanfona reconhecidos pelos maiores compositores de forró do Brasil. E é filho da "lenda" Chico Elion e da cantora Déa Ferreira, uma das integrantes do trio vocal As Irmãs Ferreira - uma espécie de gênesis dos trios potiguares.

Kiko Chagas devia ser desses artistas puxados ao tapete vermelho da fama só pela herança genética. Tipo o Fiuk, filho de Fábio Júnior. Mas o cara mora em Natal. Nem mesmo o pai, Chico Elion - autor de clássicos da MPB como Ranchinho de Páia e Moinho de Vento - recebe o reconhecimento merecido. Para reescrever a história familiar, Kiko buscou seu lugar ao sol fora da Cidade do Sol. No Rio de Janeiro e Salvador tocou com Tim Maia, Elza Soares, Jimmy Cliff, Jards Macalé, Sérgio Sampaio, Luís Melodia e outros que preencheriam bons parágrafos.

Os vídeos exibidos na pequena sala da residência situada na Vila Gerusa, no Alecrim, relembram épocas mais promissoras. No programa especial de Tim Maia no Globo de Ouro, na Rede Globo, lá estava a vasta cabeleira de Kiko Chagas e seus solos de guitarra, integrante da banda Vitória Régia, que acompanhou (ou aturou) Tim Maia por longos anos Brasil afora. No programa de Fernando Lobo, na TVE, o potiguar recebe elogios da apresentadora antes da interpretar suas composições. Ou no Hotel Marina, no Leblon (aquele da música), junto a alguns dos melhores instrumentistas nacionais e sob olhares de atrizes como Patrícia Pillar.

Quando excursionou com Elza Soares pela Bahia, Kiko enxergou um oásis musical. A cultura baiana puxou Kiko pelo braço da guitarra e o levou para junto de Paulinho Boca de Cantor, Gerônimo, Batatinha, e outros autênticos músicos baianos. Na gravaçãoao vivo de um show na capital baiana, Kiko divide o palco com Pepeu Gomes e Luís Caldas. Na terra de Caymmi, Kiko se viu filho de Gandhi, identificado com os afoxés, aguerês de oxossi, o pau elétrico e ritmos baianos e tentou firmar sua carreira solo. "Jogava música pra todo mundo". Uma delas, É Amor, ganhou as rádios e palcos do país na interpretação da banda Cheiro de Amor, tocada até no Criança Esperança, da Rede Globo.

Lançamento
Após participação como instrumentista, produtor ou diretor musical em quase uma dezena de álbuns, como a coletânea Do Lundu ao Axé, com uma reunião das composições mais marcantes da história da música baiana, Kiko Chagas lançou seu primeiro solo ano passado, intitulado Estudando o Forró. Ele um descendente do mestre sanfoneiro Manel de Elias, em sua época considerado um dos melhores do ofício, junto com Januário Abdias, Zé Calixto e Geraldo Correia, ou mesmo da mãe Déa Ferreira, parceira de Jackson do Pandeiro e intérprete da música regional antes de se lançar ao Rio de Janeiropara cantar Hianto de Almeida no Teatro Municipal de São Paulo, em 1962.

Este ano virá novo lançamento de Kiko Chagas. Contemplado pelo edital de música Núbia Lafayette, da Fundação José Augusto, receberá nos próximos dias a matriz e 100 cópias do CD Kiko Chagas canta Chico Elion. São 12 faixas de releituras dos clássicos do pai Chico Elion, já interpretados por Luís Gonzaga, Trio Irakitan, Trio Maraiá e gravações até na França. "Introduzi uma brasilidade às composições, com influências dos ritmos afros e uma pegada 'joão gilbertiana', do violão de Baden Powell. São releituras e arranjos meus para relembrar esses clássicos da MPB", se orgulha o músico.

Para a gravação no estúdio de Jota Marciano, Kiko Chagas chamou uma seleção de músicos potiguares com Di Stéfano na bateria, Wagner Tse na percussão, Moisés no contrabaixo, Sandro (ex-Quinteto Violado) e Carlos Zens na flauta, maestro Franklin Nogvaes no teclado, Betinha e Marquinhos nos vocais. Kiko ainda não tem data, nem lugar nem recurso para bancar o lançamento do CD. E por enquanto se arrisca nas premiações nos festivais de música da cidade ou "vendendo o almoço pra comprar o jantar", como fazia nas épocas de "ralação" no começo da carreira no Rio de Janeiro, há insistentes 30 anos.

Matéria publicada hoje no Diário de Natal (AQUI)
- Foto Evaldo Gomes

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