Babal é global. A rima é pobre, mas o significado é luxuoso. O compositor potiguar está presente na trilha sonora da recente novela Araguaia, da Rede Globo. O amanhã é distante é interpretada por Zé Ramalho. A música é uma versão de Tomorow is a long time, de Bob Dylan. E Babal é mestre numa arte pouco debatida e até banalizada entre os músicos: a composição versada de outras canções.
A composição foi escrita em parceria entre Babal e Geraldo Azevedo em 1982 e gravada por Geraldo em 1985, no álbum A Luz do Solo. A música integra o setlist de Geraldo Azevedo em vários shows. Em recente CD em homenagem a Bob Dylan, Zé Ramalho gravou a música e foi selecionada à novela. O amanhã é distante é um folk bem encaixado no cenário ruralista do programa e respeita o ritmo original da música.
Boas versões exigem respeito ao ritmo original e ainda métrica e rima compatível. “Se fugimos do original, perde sonoridade. Se a canção tem estrofes cada uma de quatro versos e rimas entre elas, é preciso fechar o sentido da melodia ou fica solto no ouvido”. Babal pesquisa antes de escrever. Alguns termos em inglês são incabíveis na língua portuguesa. Então, é preciso “abrasileirar” palavras, expressões e gírias.
“Halloween, por exemplo, não tem a menor importância pra gente. É como se fosse nosso São João. (Gilberto) Gil trabalha muito bem isso. Em No woman no cry (de Bob Marley), no lugar de ‘In the government yard in trenchtown’, Gil escreveu ‘na grama do aterro sob o sol’. Isso porque ‘government yard in Trenchtown’ é jardim público de área periférica na Jamaica. Mas não no Brasil”.
Babal remonta à etnografia para busca de expressões certeiras na substituição de outras expressões culturalmente significativas em outras línguas. “Portugal, antes de nos descobrir, foi dominado pelos árabes. Também temos muito de árabe. Então, há vasto caminho para a música. E se puxamos o fio da história, o linguajar da época, encontramos um rosário de acontecimentos. Isso é legal quando se coloca na composição”.
Para Babal, a banalização e o desrrespeito às versões originais merecem discussão aprofundada. “Dylan canta músicas de qualidade indiscutível. O último disco foi belíssimo. Melodias rebuscadas e simplicidade de outro mundo. As letras obedecem rimas. O que bandas de gosto duvidoso fazem é um desrrespeito brutal: letras ridículas sem qualquer ligação com a composição original”.
O compositor exemplifica a necessidade de ritmo e som nas letras com a música Zanzibar, de Fausto Nilo. “Lendo, a música nada diz: ‘No azul de Jezebel
No céu de Calcutá /Feliz constelação/Reluz no corpo dela/ Ai tricolor colar’. Mas cantada, é linda. Poesia e música se fundem em alguns casos”. E conclui: “Queremos trazer esse debate aos compopsitores potiguares. Pecamos muito porque queremos terminar uma composição. O assunto é vasto”.
* Matéria publicada no Diário de Natal no último domingo
Nenhum comentário:
Postar um comentário