segunda-feira, 18 de outubro de 2010

O futuro dos institutos federais

Por Pablo Capistrano
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Trabalhei um ano no campus do IFRN em Santa Cruz (120 Km de Natal). Nesse tempo, a equipe de técnicos administrativos e de professores implantou dois cursos técnicos, um de informática e outro de refrigeração, atuou junto ao programa de educação de jovens e adultos trazendo de volta a sala de aula pessoas que não haviam conseguido completar o ensino médio. Implantou-se um curso de especialização em Educação Ambiental e Geografia do Semi-árido para professores da rede pública e privada de ensino que atuam na região, além de uma licenciatura em Física, dando a dezenas de jovens a oportunidade de fazer um curso de graduação sem ter que migrar para a capital.Assim como em Sana Cruz, outras cidades do interior do nordeste estão tendo sua realidade transformada pela presença dos campi dos Institutos Federais.

É por isso que eu me arrepiei ao ler na Folha de São Paulo uma reportagem assinada por Ricardo Westin intitulada "Dilma e Serra têm concepções opostas sobre ensino técnico". No texto, Westin escreve: "Embora pareçam concordar, Dilma e Serra em nenhum momento avisaram ao eleitor que suas concepções de ensino técnico são bem diferentes, quase opostas". Mas a frente o jornalista completa: "o candidato do PSDB defende que a escola tenha exclusivamente cursos técnicos. Para entrar o estudante deve já ter concluído ou ao menos estar cursando (em outra escola) o ensino médioo".

Se a ideia de Dilma é expandir o modelo dos IFs pelo Brasil, o de Serra é desmembrar o ensino técnico do ensino médio oferecendo, como regra geral, o modelo do curso subsequente, no qual o aluno se prepara apenas nas disciplinas técnicas, ficando dependente da rede pública estadual para completar sua formação geral.

O modelo do ensino técnico de Serra é baseado nas Escolas Técnicas de São Paulo que guarda semelhanças com o sistema do SESC/SENAI, como afirma Maria Sylvia Simões Bueno professora da USP na mesma reportagem: "O modelo de São Paulo tem preocupação excessiva de reduzir os custos. A formação dos estudantes é aligeirada. Os professores não conseguem desenvolver bem seus programas".

Essa visão do ensino técnico parece mostrar uma verdade desconcertante sobre o PSDB e sobre o universo conceitual de José Serra: eles pensam o país a partir de São Paulo. Talvez um modelo desse tipo possa até servir para o estado mais rico do Brasil onde (segundo afirma a propaganda eleitoral tucana) as escolas públicas de ensino médio têm uma "qualidade finlandesa", mas o fato é que esse modelo seria uma grande tragédia se implantado no Nordeste ou no Norte do Brasil, por exemplo.

O sentido fundamental da expansão dos IFs no governo Lula foi o de contribuir ativamente para transformação educacional e social integral das comunidades nas quais atua, de modo a construir uma rede articulando ensino médio, ensino técnico, graduação e pós-graduação a fim de contribuir para a melhora dos índices de educação no interior do país. No RN, por exemplo, tentou-se implantar o modelo de Serra quando Paulo Renato era ministro da educação e os efeitos foram ridículos.

Ao pensar o Brasil a partir de seu próprio quintal (São Paulo) Serra acaba por cometer um erro histórico, que já comprometeu a qualidade de vida e o desenvolvimento social do povo brasileiro por muitos e muitos séculos. Serra (ou o seu auxiliar para assuntos educacionais) não parece ter a sensibilidade social de alguém que conhece a diversidade brasileira e erra profundamente ao imaginar que um modelo que funciona em São Paulo pode ser exportado com sucesso para outras regiões.

Mas talvez não seja isso que importa, porque parece que a grande obsessão do PSDB e da tecnocracia tucana são os custos, os gastos e a lógica de reduzir os serviços públicos e as políticas de desenvolvimento social ao mínimo. O elemento humano e social da educação se esfacela na mentalidade fria dos números que tratam alunos como gráficos da bolsa de valores.

Nós, professores da rede federal de ensino, já sabemos o que acontece quando essa lógica que toma a Avenida Paulista como a medida do mundo é transportada para a educação pública brasileira. O terrível dessa eleição é que questões importantes como essa se dissolvem no falatório do marketing, no leilão de promessas mirabolantes e da guerra suja de boatos. Você, leitor amigo, precisa prestar atenção nesses detalhes antes de votar, sob pena de comprar um produto muito bem embalado, mas que já está com a validade vencida a mais de oito anos, por pura negligência na leitura atenta do rótulo.

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