terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Meu cinema em 2010 ― 1/2

por Wellington Machado
em Digestivo Cultural

Ao percorrer a lista de filmes que aqui chegaram em 2010, separei alguns que mais me chamaram a atenção. Muitos deles chegaram às locadoras sem serem exibidos no cinema. São eles:

Aconteceu em Woodstock (Ang Lee, EUA, 2009) ― Um retrato de como se deu a arquitetura da realização do histórico festival em 1969. Um filme competente do diretor Ang Lee (O tigre e o dragão; O segredo de Brokeback Mountain; Razão e sensibilidade), que faz uma ótima reconstituição de época, fazendo o espectador entrar no clima do festival, sem mostrar uma banda sequer (apenas o som ao fundo). Destaque para uma cena "lisérgica" dentro de uma Kombi, só comparável a uma outra do mesmo estilo, feita em Sem Destino (1969), de Dennis Hopper.

O homem que engarrafava nuvens (Lírio Ferreira, Brasil, 2009) ― Um dos melhores documentários do ano. Para quem pensa que baião é coisa "só" de Luiz Gonzaga, não pode perder este filme. Tão importante quanto o "Gonzagão", o compositor Humberto Teixeira, figura um tanto ofuscada pelo sanfoneiro, tem seu merecido reconhecimento neste documentário. O filme é também uma verdadeira história do baião e uma genealogia da música brasileira, quase toda derivada do ritmo. Lírio Ferreira, diretor de Baile perfumado (1997), Árido movie (2006) e Cartola (2006), fez uma intensa pesquisa em jornais e levantou um raro acervo de imagens de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira. Com uma montagem ágil, mesclando recortes de jornais, depoimentos de cantores contemporâneos e imagens de arquivo, o filme não é nem um pouco cansativo, apesar de didático. O homem que engarrafava nuvens mostra como o baião incrivelmente, nos anos 50, ganhou o mundo (há um depoimento de David Byrne sobre o ritmo) e influenciou a Bossa Nova. Certamente este documentário integrará a minha lista de melhores documentários brasileiros, juntando-se a Edifício Master, O fim e o princípio e Jogo de Cena (de Eduardo Coutinho), Garapa (José Padilha), Santiago (João Moreira Salles), A alma do osso (Cao Guimarães) e Estamira (Marcos prado).

Onde vivem os monstros (Spike Jonze, EUA, 2009) ― Adaptação do livro de Maurice Sendak lançado em 1963 (que já vendeu mais de 19 milhões de exemplares até hoje). O filme é interessante tanto para crianças como para adultos. A sensacional história de um garoto que foge da cidade para entrar em um mundo fantástico, onde se torna rei diante de animais selvagens, é uma obra-prima do diretor Spike Jonze (Quero ser John Malkovich e Adaptação). O grande mérito do filme é, ao contrário dos 99% dos filmes infanto-juvenis lançados, mostrar que a tristeza é uma realidade, até nos filmes de fantasia. O tom sombrio e lúgubre prende o espectador e o desfecho da história deixa as crianças um tanto decepcionadas ― o que é bom.

Guerra ao terror (Kathryn Bigelow, EUA, 2008) ― O filme chegou com atraso, mas faturou o Oscar em 2010. Assim como o Tropa de elite, mostra a guerra (do Iraque) sob o enfoque da tensão de um grupo de soldados especializado em desativar bombas deixadas pelos nativos resistentes à ocupação americana. Entende-se, diante da complexidade das situações postas ao exército nessa guerra insana, os motivos pelos quais os Estados Unidos têm dificuldades em deixar o país. Sem heroísmos e cenas sensacionalistas, Guerra ao terror é um filme enxuto que nos faz refletir o drama das famílias de americanos que têm seus filhos lutando no Iraque.

O segredo dos seus olhos (Juan José Campanella, Argentina, 2009) ― Sem sombra de dúvidas, o melhor filme de ficção do ano. É um policial (muita gente ignora isto) equilibrado, que mescla drama pessoal, investigação e paixão, com pitadas de humor. O filme aborda a história de um agente do judiciário que se propõe a escrever um livro ao se aposentar. Ele acaba rememorando um crime ocorrido em 1974, do qual participou da investigação. O segredo dos seus olhos representa o ápice do cinema argentino atual. Prova que os nossos vizinhos estão bem superiores ao Brasil no quesito cinema. Campanella e Daniel Burman (sobre quem falarei no próximo texto) são os melhores diretores argentinos em atividade. E o país tem também um dos melhores atores do mundo: Ricardo Darín. Os argentinos têm produzido filmes densos, abordando conflitos familiares, dramas pessoais e psicológicos, sem abrir mão de entreter. Enquanto o cinema argentino emplaca sucessos a cada ano, nós, brasileiros, continuamos achando graça do Tony Ramos depilando as costas...

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